segunda-feira, 29 de setembro de 2008

"I think I need to find a bigger place..."
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" It's a mistery to me
we have a greed
with which we have agreed
You think you have to want
more than you need
until you have it all you won't be free."

sábado, 27 de setembro de 2008

B- Side
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Hoje acordei mais para lá do que para cá, literalmente. Eu tenho, pelo menos, duas versões de mim. Atrevo-me a dizer que uma dessas versões é moderadamente sociável, já a outra nem por isso. Li uma frase algures, era eu uma parvinha adolescente [que previa para si própria um destino terrível, a abarrotar de desgraças, quando, naqueles sábados à noite, o poder paternal se impunha e dizia “Hoje ficas a ver a vida através da tela.”], que ditava assim:
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"Espelho de duas faces: ora plana, ora curva. Ora límpida, ora turva. Numa te afirmas, na outra te negas... em ambas crês.".
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A adolêscencia foi-se, a parvoíce insiste. Portanto, hoje acordei turva e curva. Houve até quem me dissesse que, este meu lado B [ou será o A?!], faz de mim uma pessoa “cáustica”, e eu até hoje ainda não arranjei adjectivo que melhor o descrevesse. Não é necessário existir uma causa que justifique o despertar desse "monstro caústico" em mim. Acordo e pronto... lá está ele de olhos esbugalhados, a ler um livro ou a tomar café, a fingir que não incomoda ninguém. Já houve até um par de vezes em que me obriguei a deitar-me cedo demais, porque a minha própria paciência declarou-se vencida, na batalha de me aturar a mim própria. Nesses dias, esqueço completamente a noção de movimento, e permito-me acreditar que é enquanto se dorme que os dentes se mexem e a vida se resolve.
Quer isto dizer que o meu dia hoje não está a correr muito bem … E em vez do sossego que a alma reclama aos gritos…
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O homem do gás voltou outra vez. Mais uma vez. Anda por aí, sobe e desce, diz ele que há coisas que precisam de ser feitas, “pra legalizar”. Eu deixo-o. Deixo-o, porque sou gaja e a mínima suspeita de que o aviso “perigo de explosão” se pode tornar realidade, me força ao afastamento. Crio a distância que me é possível, não a desejada. Se bem que, gaja que é gaja, em eminência de perigo, cria uma distância segura, mas não exagerada. Afasta-se só até onde sabe que não se pode aleijar, e não mais que isso, não vá a coisa realmente dar-se: "Ai, nem imaginas o que aconteceu e estava tão perto... e foi assim e assim, e blá, blá…” . Seja como for, deixei-o lá, a martelar e a esburacar à vontade, mas, enquanto enchia a chávena de café, deixei-lhe bem claro com o olhar: "Vê lá se desamparas de uma vez por todas, isto é uma casa, não é uma central.".
Lembro-me que devia ir à faculdade. Tenho assuntos pendentes com o gabinete de contabilidade dessa instituição. Fui lá ontem. A “responsável” não estava. Tinha ido a uma consulta, e podia ou não voltar. Perguntei “Então como vamos resolver este problema?”. Resposta “Pois…eu não sei.”. Contra resposta “Se você não sabe, eu muito menos.”. Ontem, como foi um dia como outro qualquer, aceitei a mensagem entre linhas “Por favor, não me obrigue a tomar qualquer procedimento para a solução do seu problema. Não posso passar por isso agora, depois de 20 anos a trabalhar na função pública.”. Devia lá voltar hoje, mas hoje para mim não é dia de voltas.
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Bebi o café na varanda posta ao sol. Há qualquer coisa nos horizontes que dominam o reboliço cá dentro. O homem sai, sem prometer voltar. Silêncio: “O meu tornado está a descansar.”
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" Tanto ruído no interior deste silêncio: são as vozes dos outros a falarem em mim, pessoas de quem gostei, pessoas que perdi, gente que tenho ainda. Não me parece que herdei muito dos meus pais, dos meus avós: algumas coisas mais ou menos superficiais mas lá no fundo nada. Princípios, claro. Regras. O resto, quase tudo, fiz sempre sozinho. E estive sozinho nos momentos mais difíceis da vida, que sofri na carne como um cão: aquilo que, destilado, aparece nos livros, que são o itinerário de uma aprendizagem e de uma dor, a certeza da vida redimir a morte, da necessidade da alegria, de uma paz intransigente conquistada a pulso. A humilde capacidade de admirar as pessoas, respeitá-las, que tanto tempo levei a conseguir. Olhar nos olhos o que um ano destes não serei. Custa-me a ideia de não escrever, um dia. Do mundo continuar sem mim. De perder corpos, calor: o que ganharei em troca? O meu pai foi-se embora há quatro anos: percebo hoje que existia entre eu e a morte, a defender-me sem saber que me defendia e que a partir de então, quando ela tocar à campainha, é a minha vez de abrir a porta: não quero chegar à maçaneta a tropeçar, quero mostrar-lhe a casa limpa e pronta. Dizer a quem se achar ao meu lado
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– Eu já venho
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e descer as escadas. Não se incomodem, não se levantem: sou capaz de descer as escadas sem ajuda até vários palmos abaixo da terra. Espero que haja sol nesse dia, um arrepio alegre nas árvores. Não se incomodem que eu já venho. Sentir-me-ão nos objectos, deixarão de sentir-me a pouco e pouco à medida que a saudade se atenua. Continuarei aqui através dos meus livros, na altura em que ninguém meu conhecido sobrar.
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Esta não é uma crónica melancólica: é a obstinação do ofício que pratico desde que me conheço, afastando sempre o que o estorvava. Pagam-me para fazer o que faria de qualquer maneira e portanto sou uma criatura feliz. Na altura em que a morte, de que falei há bocado, chegar, já a venci."
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António Lobo Antunes
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* Serei "... uma criatura feliz. E, na altura em que a morte, de que falei há bocado, chegar, já a venci."
Futuralmente Diferentes
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Acabo de ler uma entrevista a Mia Couto em que ele explica que em certas tribos africanas a palavra "futuro" não existe. Existe a ideia de futuro, mas anteciparem-se a ele [idealizar o amanhã] representa uma transgressão, porque o território do futuro pertence aos deuses. Ao contrário da nossa ocidental ideia de que o futuro está além, para ele esse bicho é uma construção do momento, que é como quem diz, o futuro não é "agora", mas é imediatamente a seguir. Num exemplo prático isto pode significar que nós, ocidentalizados até aos ossos, antes de fazer um bolo já pusemos a mesa, abrimos o vinho, e convidamos os amigos, enquanto eles aguardam pacientemente até ao final da confecção do manjar para depois poderem fazer tudo isso. É que afinal o bolo não existe até ao momento em que está realmente pronto, até porque a coisa pode correr mal e o dito cujo pode nunca vir a existir. E ora bem, é ver-nos a nós a roer as unhas porque as coisas não correm/correram como planeamos, e é vê-los a aceitar o presente, porque nem sequer o "daqui a bocado" lhes pertence.